terça-feira, 12 de outubro de 2010

Clair de lune

Debruçado em meus pensamentos
penso nela
notas cálidas, breves, profundas
chamas que em meu peito apavoraram...

Meu rosto de criança, meu sorriso
perdido em meio à multidão, ao frio,
em meio à grande cidade que come sonhos
que comeu os meus, que talvez tenha os dela comido também...

Como, se ao cair da noite, penso nela?
Como, se ao debruçar-me na janela, vejo-a

Nua

Branca

Marcada por guerras e ideais, inteiramente branca,
inteiramente só.

Seus dedos percorrem meu corpo
Seu sabor inebria meus sentidos

Deus, quisera entender o que me causa sua imagem
Sua luz, sua frieza, seu furor, sua rubra luz ao cair da noite em dias insuspeitáveis de fogo intenso em dias frios, frios e secos e sérios...

sérios demais

Lua rubra, vejo-te das pontes partidas em cidades inóspitas

Vejo-te em noites incandescentes de furor e loucura!

Vejo-te, nua, Lua, vejo-te inteira!

Desejo teu gosto em minha boca sedenta de desertos imemoriais...

Dos passos que dei, tua cor… teu cheiro, teu sabor...

Lua, Lua, Lua, sobe ao céu mais esta noite

Somente nesta noite, atende ao meu clamor!

Danço, canto, circunvoluo meu corpo, meus passos, meus sonhos… tribal, Lua...

Lanço-te o grito ancestral: faz de mim amor e mais nada.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Revisão I

Coloco-me frente à frente
com a folha de papel.
Como riscá-la, palavra,
como acreditar que seus
traços foram em vão?

Decuido grotesco de mãos
sem razão, cuidado, culpa,
dor mesma de verter em
palavras que não calam

Como arriscar tornar-te
compreensível, palavra?
É tua vontade querer dizer?
É tua vontade querer ser?

Ah!, Palavra, risco-te pela necessidade
Risco-te sem ao menos poder em
silêncio
chorar um poema perdido

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Palavra: o nado inanimado

Aos poucos as palavras vão se afastando de mim
Notoriamente seus segredos não me querem se revelar
o que sinto, o que julgo, o que penso, penso, penso
sinto-as endurecer e se esvair rápido demais

Não há pensamento,
não há desejo e Drummond já me alertava
que não
bastava, que não era poesia e a poesia...

sem perceber eu a lia rápido demais e a rapidez se fez fera
e a rapidez
tomou meu corpo,
tomou meu sonho,
tomou meu universo líquido a mil por hora,
tomou o som
e emudeceu.

Tomou o significante,
tomou o significado e tomou a mim.

Agora, nado, nado no oceano de palavras mortas que não esperam
inanimadas
não aguardam
nada
de mais de mim e sacudo-as:
FALA!
grito em desespero que me surrem o rosto (ACORDA, POETA), que me [raspem o coração até sangrar e arder muito pra que eu possa, enfim

Palavra

sexta-feira, 23 de abril de 2010

A ilha (na ilha)

Uma ilha vazia

Restam nela, perdidos, traços incomuns
Algo espesso, como uma barba espessa
Algo claro, como pele clara
Algo fechado, como olhos fechados

Na ilha há a tristeza de quem esteve e não mais está
Na ilha resiste às imagens o tempo
Na ilha resistem as lembranças de que foram humanos
(Fomos humanos talvez)
Na ilha resistem cheiros e lembranças
Na ilha resistem os irmãos e as vozes a ecoar do primeiro grito
Grito absurdo! Que dói! Dói!

Na ilha resistem fragmentos de histórias-sem-fim sem fim em si mesmas

Na ilha contam-se histórias absurdas de estradas e carros e gentes
Na ilha contam-se histórias absurdas de trens e vagões no calor
Na ilha contam-se até histórias de amor
Na ilha nada mais há
Na ilha resta a ilha
Resta o nada na ilha
Resta o eco na ilha
Restam os traços na ilha
Resta o endereço na ilha da ilha

Da ilha nada mais resta
Na ilha há apenas
A ilha